domingo, 29 de abril de 2012

A Organização do Cosmos Parte 1: O Grelhador




A Pescada fez o Universo à sua medida. Se dividirmos o corpo de qualquer peixe (que, por sua vez, foi feito à imagem da Pescada Original), obteremos três segmentos bem definidas: a cabeça, a posta e a barbatana. Cada uma delas serve de modelo para a organização das três partes do cosmos: o Jacuzzi, o Mundo e o Grelhador.

Na cabeça estão o cérebro e os olhos do peixe, aquilo que o dirige, que o permite pensar, que o conduz pelos rios da vida; está representada pelo Jacuzzi infinito com que a Pescada premeia os seus fiéis, e que serve de incentivo para uma vida plena.

As postas estão cheias de espinhas, e encontram-se ligadas por uma espinha central quer à cabeça, quer à barbatana; é a vida do dia-a-dia, cheia de dificuldades, que tanto pode conduzir ao Jacuzzi como ao Grelhador.

A barbatana é para agitar e fugir dos predadores;  daí o medo que nos dá o Grelhador e as suas chamas assustadoras.

Porque estes temas exigem tempo e maturação espiritual, falaremos hoje apenas de um destes níveis: o Grelhador. Não porque seja o mais relevante; tudo no mundo é igualmente relevante aos olhos da Pescada. É apenas importante que o fiel informado tenha rápida e plena consciência do que o espera caso comece a tomar certas liberdades e se porte mal.

O Grelhador é um espaço sem tempo e sem dimensões: é infinito a dar com uma barbatana. Não tem princípio nem fim, e nem convém; são tantas as almas que o populam que, tendo um fim, já estaria cheio. É um espaço vermelho, cheio de fumo e chamas, onde as almas daqueles que fizeram umas coisas más ao longo da vida são tratadas como merecem: isto é, são torturadas da forma mais horrenda para toda a Eternidade.

As torturas são personalizadas: para diferentes atentados contra a paciência da Pescada há diferentes temperaturas, concentrações de fumos nefastos, altura de labaredas ou dimensões de grelhas a ferver. E pior que tudo: não há uma única gota de água em todo o Grelhador, e todos os castigados são polvilhados com sal. Isto produz uma irritação cutânea tramada além da sede e das queimaduras de terceiro grau que imperam para aqueles que negam a Pescada.

“Mas a Teoria da Evolução diz-nos que quem nega a Pescada não faz necessariamente mal a ninguém!”, dirão logo os futuros inquilinos do Grelhador. Esquecem-se que a Pescada perdoa tudo; ou quase tudo. A Pescada perdoa violadores, ladrões, contrabandistas, terroristas, abusadores sexuais, predadores e ditadores; todos estes crimes, apesar de desagradáveis, podem ser corrigidos com um arrependimento mesmo muito sincero dos seus praticantes e (nunca esquecer) com uma aceitação clara e inequívoca da Pescada como Peixe Que Morreu Por Nós.

Aceitando o sacrifício que a Pescada fez, claro, e mostrando que a Ama, o mais terrível dos seres humanos pode encontrar a paz espiritual. As suas vítimas terão o consolo de saber que quem lhes fez mal não só é perdoado, como entra no Jacuzzi e, portanto, no círculo de fiéis da Pescada. E é bom que elas próprias façam o mesmo, senão terão o azar de ter tomado a decisão consciente de... descer ao Grelhador.

Isto porque todos os crimes que descrevemos atrás são atentados contra a criação da Pescada, mas não contra Ela própria. A Pescada tem mais que fazer senão preocupar-se com os resultados do livre-arbítrio que deu à sua criação; agora, se há coisa que a aborrece é ter gente que não a adora. Por isso é que apenas um crime hediondo não pode, e não é, perdoado pelo Peixe-Pai: o ateísmo.

Fiem-se nisto, meus caríssimos carapaus espirituais: crer na Pescada não é a melhor forma de levar uma vida plena e, principalmente, obter uma recompensa agradável depois da morte. Crer na Pescada é a ÚNICA maneira de evitar uma eternidade de queimaduras e garganta seca.

Claro que os ateus que nos rodeiam, e os hereges de outras religiões, negam esta evidência e dizem que um sistema destes é uma injustiça e uma barbaridade. Como são amorosos, aqueles que decidem conscientemente não aceitar a Pescada! Mas que esperam eles de um ser Todo-Poderoso e Omnibenevolente senão uma tortura infinita dirigida a quem não O ama?

“Mas a Teoria da Evolução diz-nos que outras religiões têm outros infernos e locais de sofrimento eterno. Porque deveremos levar o Grelhador a sério?”, perguntam os ateus a rir à gargalhada. A resposta é teologicamente complexa, mas vou tentar resumi-la: porque ele existe mesmo a sério, ao contrário de todos os outros castigos divinos. Ponto final.  

Claro que há quem corra o risco. Há quem pense que se safa deste e de outros castigos divinos se utilizar a Evolução, o Big Bang e outras construções heréticas para se defender da Verdade. Mas a esses digo: experimentem queimar-se na ponta do dedo. Agora multipliquem essa sensação pelo corpo todo. Agora multipliquem isso por mil. Agora pensem nessa dor para toda a eternidade. Não vos dá medo? Não vos parece desagradável? Se sim, então é porque lá no fundo, no mais puro cerne espiritual que a Pescada colocou em vós, sabem que a ameaça do Grelhador não só é real, como dói a sério.

Façam por evitá-la: juntem-se a nós.

Salvem os vossos amigos e familiares do Grelhador! Como? Organizem-nos num homogéneo cardume intelectual e físico e conduzam-nos até ao espaço da nossa Igreja. O resto é connosco.

Para a semana falaremos de mais um aspecto da nossa crença totalmente fundamentada, e daqui a algum tempo continuaremos o nosso estudo da organização do cosmos com um sermão sobre esse lugar mágico que eu, vós, e todos (e apenas) aqueles que vocês conseguirem trazer para o nosso pequeno grupo poderão alguma vez vivenciar: o Jacuzzi.

Ide, e dai com a barbatana da Verdade na testa de quem não quer ver. Até para a semana.

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